Dia Trinta
Fomos os últimos a acordar – e pelo menos agora eu não sou o único, hehehe, encontrei meu grupo perfeito – no agradável albergue de Fonfría. Enquanto tomávamos café, nos alcançaram, de outras cidades, Dani e Erin, Leen e Kate, e Sharyar e sua mãe, panamenhos muito simpáticos. É a quarta vez que a mãe de Sharyar faz o caminho, e disse que queria realizá-lo com seu filho, pois talvez poderia ser sua última viagem. Sharyar deixou sua esposa e filha no Panamá, e a acompanhou sem pestanejar.
Durante o café conhecemos duas Martas, de Zaragoza, que começaram a fazer parte da nossa turma. Paramos em Triacastela para comprar algo para comer, e Leen e Kate não conseguiram tirar dinheiro no banco, pois o caixa estava quebrado. Ligaram para suas casas e conseguiriam uma remessa de dinheiro só para o dia seguinte, em Sarria, então emprestei a elas o suficiente para sobreviverem, e seguimos.
Paramos para comer no meio da estrada, onde ouvimos ao longe um barulho de cachoeira. Largamos as mochilas no mato e descemos pela floresta até ela. Era uma coisa maravilhosa – na verdade, qualquer centímetro das rotas dentro das florestas da Galicia é um show à parte: você não consegue andar cinco passos sem querer tirar outra foto.
Depois de muito tempo ali, vi que já eram 17h, e em uma hora começaria o jogo do Brasil X Austrália, segunda participação brasileira na Copa. Faltavam 7 km até Samos, então larguei todos ali e comecei a “correr”. Nunca andei tão rápido. Esqueci que levava um grande peso nas costas e até desencanei um pouco da dor nos pés… uma hora, acostumamos, mesmo. A papete realmente não é uma solução para grandes distâncias, pois notei que 70% do meu sofrimento nos dias passados era exclusivamente dela.
Cheguei a Samos e saí atrás de uma TV. No primeiro bar, passava uma tourada. Perguntei aonde eu poderia ver o jogo, e o cara falou que seria impossível. Fiquei desesperado, e procurei outro bar: tourada. Andei quase 1 km e cheguei na frente do Monasterio, onde havia o albergue e, do outro lado da rua, o último bar do pueblo. Entrei e na TV passava a mesma maldita tourada. Como o bar estava vazio, pedi para a dona mudar para o jogo, e o 2º tempo estava para começar. Aos 4 minutos, o Brasil fez um gol, e eu saí para fora do bar gritando e agitando a bandeira para os outros, que estavam chegando na frente do albergue. Leen e Kate terminaram de ver o jogo comigo, enquanto bebíamos umas jarras de chopp (a partir da Galicia, é mais comum encontrar as jarras, de 500 ml, em vez das cañas, de 200 a 300 ml – achei um link bem didático sobre isso) e comemorávamos o segundo gol do Brasil, quase no apito final.
Compramos umas coisas para comer e cenamos na beira do rio Sarria eu, Dani, Erin, Domenico, Javi e as Martas. Mais tarde apareceram Karin, Dario e Leen para dizer boa noite e avisar que a porta do albergue estava para fechar. Recolhemos tudo às pressas, corremos e conseguimos entrar.
Na madrugada, sonhei que andava por uma montanha e comecei a ouvir uma voz conhecida, ao longe, cantando. Parei para esperar sua chegada e era Rasmus, que eu não via desde Carrión de los Condes (05/06/06). Nos abraçamos e começamos a chorar, como se estivéssemos nos despedindo. Aquilo foi assustadoramente real, e ao despertar percebi que ainda chorava. Demorei a dormir, depois disso, mas aquela sensação de despedida ainda perduraria por muito tempo.
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