TOMO III – Paraíso (16 de junho a 2 de julho de 2006)
Dia Vinte e Oito
Acordei relativamente bem, e fui um dos últimos a sair do albergue de Cacabelos – isso já virou uma rotina. Depois de andar nem 50 metros, parei com fortes dores nos pés. Isso só podia ser um aviso: tudo o que passei nos últimos dias com a papete precisava chegar ao fim, e afinal, depois de ontem, eu precisava fazer uma mudança drástica. Tirei com dificuldade todo o jornal que eu havia socado em minhas botas desde León (10/06/06) e as coloquei. Não podia ter tido decisão melhor. Já havia esquecido do seu conforto, sua segurança ao caminhar em cima de pedras soltas, sua maior proteção, a sensação de “andar nas nuvens” com a palmilha de silicone e, claro, as bolhas que tudo isso provavelmente causaria. Sejam bem-vindas aos meus pés novamente, fiéis e pesadas botas, que ajudaram a detonar minhas costas com o peso em demasia na mochila…
Villafranca del Bierzo é um lugar delicioso de se passear (foto acima e a que abre esta publicação). Parei para tomar um café no famoso albergue Ave Fénix, de Jesús Jato, citado até no livro O Diário de um Mago, de Paulo Coelho, e encontrei Colin e Selena por lá. Depois seguimos juntos por uma estrada de terra cercada de vinhedos e também cerejeiras carregadas e prontas para a colheita. Pegamos um monte de cerejas para comer no caminho, e elas estavam ainda geladas pelo orvalho da manhã, uma delícia.
Em Trabadelo, eles resolveram continuar e eu parei em um bar para tomar alguma coisa. Lá reencontrei Peter, que não via desde a noite de festa em León, com novos amigos: Domenico, um italiano que mora no México, Javi, um espanhol de Bilbao que tem um hotel em Asturias, e Erin, uma americana que mora um pouco na Espanha e um pouco na Filadélfia. Seguimos juntos, cantando, rindo, e eu não podia ter feito coisa melhor: em poucos minutos ganhei grandes e divertidos amigos.
Em um bar de Ambasmestas encontramos Karin e Dario, e continuamos juntos. A chuva e meus pés não incomodam mais. Me arrependi muito de não ter recolocado as botas antes…
Eu, Karin e Dario resolvemos parar no albergue Nossa Senhora Aparecida, de Vega de Valcarce, pois eu queria conhecer esse tão famoso recanto brasileiro, e os outros seguiram para a próxima cidade, pois um amigo deles os aguardava. Nos despedimos e combinamos de nos encontrar em algum bar, o lugar mais provável para achá-los. 🙂
Particularmente, eu não gostei dele, achei totalmente falso. Fábio, de Goiás, é um cara super gente fina, ele conversa com você, é simpático e solícito. Já Itabira, também de Goiás, e dono do albergue, é muito estranho. Não sei se estava num mal dia, mas me pareceu prepotente e sem nenhum espírito de Caminho – parecia que ele estava lá mesmo só pela grana. Ele te trata como se você fosse um retardado, passando as regras e repetindo tudo de um jeito como se fôssemos deixar um rastro de baba por todo o “seu” albergue. Muito estranho. Achei insípido demais o lugar, por causa dele. [NOTA] Pesquisando aqui, não encontrei nada recente a respeito do paradeiro de Itabira. O albergue brasileiro chegou a ter outro dono, que mudou o nome, mas esse registro também é antigo. Não existe mais nenhum albergue brasileiro por lá. Uma pena. [EDITADO: 17/07/2018] Verifiquei que apareceu um albergue brasileiro em Vega de Valcarce, que pode ser visto neste link, mas não é possível saber quem cuida dele.
Dario foi dormir e eu e Karin fomos atrás de um supermercado para comprar algo para o café da manhã. Paramos em um bar para comer alguma coisa e encontramos Leen e sua amiga inglesa, Kate. Elas estavam instaladas em outro albergue, então ficamos batendo papo ali até chegar a hora deles fecharem.
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